Explosão de recuperações judiciais no agro: o sintoma jurídico de uma crise ignorada
O Brasil assiste, em silêncio, a um fenômeno que deveria acender o alerta máximo nas esferas econômica, política e jurídica: a explosão de pedidos de recuperação judicial no agronegócio. Em 2024, os produtores rurais lideraram o ranking dos pedidos de reestruturação, representando mais de 40% das novas recuperações protocoladas. Em 2025, a curva segue ascendente.
O que está acontecendo no campo é mais do que uma dificuldade passageira. É o colapso de um modelo de financiamento ultrapassado, combinado com a brutal exposição cambial e a ausência de políticas públicas eficazes para proteger o produtor em um mercado global cada vez mais volátil.
Por um lado, temos produtores endividados em dólar, pressionados por contratos de barter e margens cada vez mais espremidas por insumos importados. Por outro lado, temos a instabilidade climática, o descompasso entre oferta e demanda e a retração do crédito oficial. O resultado? Muitos produtores viram na recuperação judicial a única saída possível, não para falir, mas para resistir.
Mas o problema não para aí. Um fator cada vez mais recorrente no diagnóstico das crises do agro é a insegurança jurídica quanto à regularidade fundiária e registral dos imóveis rurais. Muitas propriedades ainda operam sob matrículas com vícios históricos, sobreposições, ou sem cadeia dominial sólida. Isso significa que, mesmo sendo produtiva e economicamente ativa, uma fazenda pode ser repentinamente surpreendida com bloqueios judiciais, disputas possessórias ou averbações constritivas, o que compromete garantias, trava financiamentos e desestabiliza juridicamente a recuperação.
O instituto da Recuperação Judicial, até pouco tempo visto como um último recurso, passou a ser uma ferramenta legítima de reorganização patrimonial e proteção da atividade econômica. O Judiciário vem reconhecendo, cada vez mais, a condição jurídica do produtor rural como agente empresarial e aplicando a Lei nº 11.101/2005 com razoabilidade.
O crescimento dos pedidos de recuperação não deve ser interpretado como oportunismo. É, antes de tudo, um grito de socorro institucional. O produtor rural brasileiro, aquele que alimenta o mundo, está se organizando juridicamente porque o sistema econômico o abandonou.
Como advogado atuante no setor há quase duas décadas, posso afirmar com convicção: a recuperação judicial, quando bem orientada, é um caminho de reconstrução, e não de ruína. O Bedran Advogados tem acompanhado de perto esse movimento e estruturado soluções jurídicas personalizadas para produtores que precisam respirar, reestruturar e seguir plantando.
Ignorar esse cenário é um erro. Criminalizar a recuperação judicial é covardia. E negligenciar a regularização fundiária no campo é condenar o agro à paralisia. O que o Brasil precisa é entender que o agro é estratégico demais para ser tratado com descaso. E que a proteção legal do produtor é, sim, uma das formas de proteger nossa soberania alimentar.
Por: Adriano Amaral Bedran, advogado especialista em direito agrário e fundiário, e CEO do Bedran Advogados.